O
transporte coletivo e as eleições para prefeito em patos de minas ou porque nossas urgências não podem caber nas urnas
Como
já escrevi em outra ocasião[1], o preço da tarifa cobrada pela Pássaro
Branco, empresa que granjeia o transporte coletivo em Patos de Minas, sempre
foi uma grande preocupação para a parte da população que faz uso do mesmo. E
não é para menos que deixem de se preocupar, pois, atualmente o preço cobrado
pela passagem é de dois reais, valor que quando somado ao fim do mês, faz falta
no bolso, principalmente do trabalhador, que constitui, sem sombra de dúvidas,
o segmento social mais prejudicado. Além do alto valor a ser a pago, o passageiro
tem que conviver com um sistema viário mal integrado, que o obriga a pegar mais
de uma condução para chegar à localidade que deseja. E tudo isso, sem mencionar
que Patos de Minas não pode nem ser considerada uma cidade de porte médio.
Na
época mencionei também que este tema foi preocupação dos políticos patenses no
ano de 2008. Durante a realização da campanha eleitoral para prefeito de Patos
de Minas, todos os candidatos, de uma forma ou de outra, apresentaram propostas
que teriam por objetivo diminuir o preço da passagem cobrada em até 30%.
Todavia, quando findaram as eleições, a candidata eleita, Béia Savassi, mudou
substancialmente a tônica do seu discurso. Sempre que questionada a respeito do
que iria fazer para solucionar o problema, a prefeita só conseguiu dar
respostas evasivas, que tendiam a mostrar o quão grande era o seu bom coração e
o quão pequeno era o seu bom senso, atitude que, por sua vez, se traduziu com
meridiana clareza nas ações por ela tomadas para diminuir o preço da passagem
durante sua gestão, ou seja: nenhuma.
Mas,
para fechar com chave de ouro (seria mais apropriado falar em chave de latão!),
a atual prefeita colocou novamente em pauta essa questão. Conforme noticia uma
matéria publicada na mídia (oficial e oficosa) de Patos[2], Béia Savassi e a Pássaro Branco
propuseram algumas medidas para manter o preço da passagem em dois reais (não
esqueçamos, que quando foi eleita em 2008, prometeu que iria diminuir e não
manter o preço da passagem!). Uma dessas medidas é a obrigatoriedade do cartão
eletrônico, dispensando o uso do dinheiro como forma de pagamento e, desse
modo, prevenindo eventuais furtos aos ônibus.
Se
lida a contrapelo, essa matéria revela questões que estão (evidentemente que de
forma deliberada) sendo cuidadosamente ocultadas. Isso nos leva a uma pergunta a
princípio prosaica, mas, de modo algum destituída de valor: quais questões ela
revela e quais ela oculta? O fato, ou melhor, o fantasma construído pela
prefeita e empresa não se sustenta de pé diante nem mesmo de uma análise
elementar e esquemática. Como amplamente é sabido, o roubo – esse efeito
perverso e insidioso da sociedade capitalista, que dá muito a poucos e pouco a
muitos – aos ônibus em nossa cidade não é tão expressivo (me lembro de um ou
outro caso episódico) para validar a argumentação de que tal prática geraria um
ônus tão grande para a Pássaro Branco, que ela se veria forçada repassar seu
prejuízo para o bolso do usuário.
Na
realidade, esse preço só poderá ser mantido (e se for!), porque a empresa irá
dispensar os funcionários que trabalham como cobradores, prática que já vinha
sendo implementada em alguns ônibus desde o ano passado, que circulavam apenas
com a presença do motorista, que, além de dirigir, também recebia o valor da
passagem.Com essa estratégia, o objetivo visado pela empresa é quebrar qualquer
laço de solidariedade classista entre os trabalhadores do transporte coletivo,
pois, os motoristas destacados para os ônibus sem o cobrador acabam assumindo
uma dupla função, se contentando com os ilusórios dez por cento que são
adicionados ao seu salário no fim do mês. No entanto, essa estratégia não opõe
apenas motoristas e cobradores, mas, também os próprios cobradores, haja vista
que, depois de definitivamente implementado o cartão eletrônico, metade
da categoria será demitida e outra será remanejada de função, passando a vender
os tais cartões em postos que serão espalhados em diferentes pontos da
cidade.Divididos internamente, a categoria se lança em uma luta corporativista
para ver quem é que ficará com o seu emprego ao fim e ao cabo desse processo,
sem perceber (de modo voluntário ou involuntário) que essa luta não deveria ser
entre eles próprios, mas, entre eles e seus patrões.
Ao
justificar essa medida, Béia argumenta que ela poderia assegurar a
manutenção do preço da passagem em dois reais, o que permitiria com que a
população continue tendo acesso aos ônibus. Escapa, entretanto, à prefeita que
os trabalhadores que serão demitidos não podem ser entendidos apenas como
cobradores, mas, também como usuários do transporte coletivo. Sem seus
empregos, como poderão eles e suas respectivas famílias, que não possuem em sua
grande maioria um meio de transporte particular, ter acesso ao transporte
coletivo? Béia não responde essa questão, nem sequer a levanta, porque fazê-lo
a forçaria a aceitar que essa medida não beneficia senão a empresa que
administra esse serviço.
Neste
ano, a exemplo do que ocorre em outras cidades brasileiras, haverá a campanha
eleitoral em Patos de Minas, em que três candidatos[3], inclusive a atual prefeita, irão
apresentar suas respectivas propostas para a prefeitura de Patos de Minas. Como
a propaganda política está apenas engatinhando não é possível saber ao certo
quais são suas posições no que se refere o assunto em questão. No entanto, o
eloqüente silêncio destes já nos permite avaliar que as suas posições não se
diferenciam significativamente daquela já assumida por Béia. E mais, diria que
ele nos oferece um termômetro para que possamos mensurar de que lado os
candidatos, a despeito da sua retórica populista, estão e sempre estarão:
contra o povo e a favor das elites, que governam a cidade desde tempos
imemoriais.
Por
esse motivo, não basta votar no candidato X ou Y, porque eles nunca irão
representar senão os seus próprios interesses. Portanto, vote certo, vote
nulo.Não basta, entretanto, anular o voto. É preciso que demonstremos alguma
capacidade ação e organização próprias, que parta dos vários e diferentes
locais em que estamos inseridos: bairros, escolas, trabalho, entre
outros para assim podermos mostrar, coletivamente, que nenhum prefeito tem
condições de resolver nossos problemas: sejam eles relativos ao transporte,
trabalho, educação, saúde, moradia etc.
Vamos
mostrar nessas eleições que nossas urgências são grandes demais para caber em
urnas[4]!
Thiago Lemos Silva é
mestre em História pela UFU e membro do Coletivo Mundo Ácrata.
[1]http://wwweidosinfozine.blogspot.com.br/2009/03/eidos-info-zine-14.html.
Naquele momento, utlizei o pseudônimo de Diego Santos.
[2]http://patoshoje.com.br/noticias/patos-de-minas/16028-transporte-coletivo-de-patos-de-minas-nao-recebera-mais-dinheiro-a-partir-de-julho.html
[3]Além
de Béia, que é candidata pelo Democratas, temos ainda Pedro Lucas, pelo PSD e
Amarildo Ferreira pelo PMDB.
[4] Retomo aqui o mote d’ “A Outra
Campanha” (http://outracampanhabrasil.blogspot.com.br/),
que, inspirada pelos zapatistas no México, procura construir no Brasil outra
forma de fazer política, com base no protagonismo e na luta popular. Pois é
"é na luta que se cria o poder popular, que fazemos valer nossos direitos
e arrancamos das elites políticas e econômicas as conquistas que
almejamos".
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